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Lições de liderança com a tartaruga Jorge: adaptação exige preparo

Em abril deste ano, a tartaruga-cabeçuda chamada Jorge voltou para a vida selvagem após viver 40 anos confinada e teve sucesso na adaptação de volta ao oceano. A história de Jorge, mesmo tão diferente, pode ser uma analogia com a Administração, gestão e clima organizacional.

Para a eventual soltura da tartaruga no mar, foram necessários três anos de reeducação, a fim de incentivar Jorge a lembrar dos instintos de sobrevivência. Assim como Jorge, os profissionais que enfrentam mudanças de setor ou de emprego, inclusive se o clima organizacional difere do anterior, também precisam de um tempo de readaptação.

Na gestão, quando essa transição não é bem gerenciada, podem surgir mais desafios a serem enfrentados, como impactos na saúde mental e insegurança no trabalho. Afastamentos temporários são cada vez mais reportados por conta de transtornos mentais, por exemplo, estresse, ansiedade ou depressão.

A precariedade da saúde mental fica escancarada com os dados do programa ‘Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho’, onde, em 2024, 461.822 trabalhadores foram afastados temporariamente devido a algum transtorno. Essas informações são disponibilizadas pela plataforma da SmartLab de Trabalho Decente, organizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pelo Escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT), com base nos registros do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Referente ao ano de 2012, o número total de concessões de benefícios previdenciários associados à saúde mental foi de 202.288, o que indica um aumento de 128,3% para os dados de 2024. Essa alta mostra que se a gestão ignora o fator humano como um elemento importante pode-se criar um ambiente de trabalho tóxico, o que compromete o bem-estar dos trabalhadores e os resultados organizacionais.

Para Alexsandra Leite, administradora e especialista em Desenvolvimento Humano e Organizacional, “ignorar o fator humano é como tentar pilotar uma empresa sem combustível. Pessoas não são apenas ‘recursos’, mas o motor que mantém a organização viva e competitiva. Quando a gestão falha em cuidar da saúde mental, abre espaço para ambientes tóxicos, marcados por medo e insegurança”. Ela ainda ressalta que, segundo a Organização Mundial da Saúde, em 2022, as condições de trabalho prejudiciais aumentam em até 81% o risco de depressão e ansiedade, enquanto a Fiocruz (2021) aponta jornadas excessivas, falta de reconhecimento e má liderança como gatilhos diretos para o esgotamento profissional.

“Cuidar das pessoas não é custo, é o investimento mais estratégico que uma empresa pode fazer para garantir resultados duradouros”, acrescenta a especialista.

Em paralelo à restauração das habilidades e à mudança de habitat da tartaruga Jorge, as instituições contam com a gestão de talentos, onboarding, requalificação, cultura e clima organizacional.

Estratégias de adaptação

A gestão de talentos é um conjunto de práticas que visa atrair, desenvolver, reter e valorizar os profissionais do mercado, de forma a alinhar os colaboradores com os objetivos da organização. O foco deste trabalho é potencializar talentos para construir uma equipe engajada que ajude a garantir os melhores resultados para a empresa.

Um dos meios de contribuir para a prosperidade de uma instituição é gerenciar talentos, capaz de identificar as pessoas aptas a impulsionar os resultados organizacionais. Essa abordagem estratégica contribui para um ambiente organizacional saudável, onde os trabalhadores se sentem motivados a querer permanecer e crescer pelas oportunidades de crescimento profissional.

Enquanto a gestão de talentos é uma soma de ações, há uma etapa que pode ser aplicada aos colaboradores, chamada de requalificação. Este método se faz necessário pela constante evolução dos métodos, processos e conceitos, e permite que os profissionais já inseridos no mercado consigam adquirir novas habilidades e oportunidades de carreira.

Ajudar os trabalhadores a ampliarem suas possibilidades de atuação também colabora para uma maior adaptabilidade a mudanças. Aplicar a requalificação é mais que capacitar, é valorizar o capital humano e diminuir gaps de habilidades, promovendo uma evolução mútua entre o profissional e a instituição.

Por último, temos o Onboarding, um processo de integração de um novo colaborador, que tem como objetivo ajudar na adaptação e na criação de vínculos com a equipe. É o primeiro passo a ser dado quando há um acréscimo de talento em uma empresa, setor ou time, como forma de mostrar que aquela pessoa é bem-vinda e transformar a ansiedade e insegurança em confiança.

Para além de uma estratégia, o Onboarding é uma metodologia completa que impacta diretamente na integração e retenção dos trabalhadores. Uma recepção acolhedora colabora para a redução de turnovers, geração de engajamento, aumento da produtividade e reforça a cultura organizacional.

Sobre como criar um ambiente de trabalho mais saudável, Alexsandra Leite afirma: “O primeiro passo para criar um ambiente organizacional saudável e acolhedor é ter líderes de verdade. Liderar exige preparo e o preparo começa por entender de gente. Uma coisa é dominar processos, produtos ou serviços; outra, completamente diferente, é compreender pessoas. Infelizmente, a gestão de pessoas ainda é subestimada por muitos.”

Ela destaca ainda a importância de conhecer profundamente cada integrante da equipe, investir em treinamentos contínuos e manter uma cultura sólida de feedback. Alexsandra diz que esses pontos são necessários para construir um ambiente saudável e acolhedor, tratando o ser humano em sua individualidade e criando uma base sólida de confiança e desempenho sustentável.

Cuidar de pessoas é essencial

Assim como Jorge teve a oportunidade de voltar a viver plenamente no oceano, as pessoas precisam de lugares que os incentivem e os ajudem a crescer profissionalmente. No mercado de trabalho, gestores, líderes, colegas de trabalho e o RH ajudam a fazer a ambientação, usando o planejamento, suporte técnico e adaptação gradual para os colaboradores em transição.

Nesse sentido, a especialista reforça que mudanças geram incertezas, mas a liderança pode transformar o processo em oportunidade, por isso uma comunicação constante e aberta é a “ponte entre o presente e o futuro desejado”.

“No fim, tudo se resume a lembrar que lidamos com pessoas, não com engrenagens. Quando vemos no outro a mesma humanidade que habita em nós, descobrimos que liderar é, antes de tudo, cuidar de corações e não apenas de resultados”, conclui Alexsandra.

Sair de um ambiente controlado e familiar é desafiador, mas se feito com organização e adaptação, as chances de sucesso aumentam. A história de Jorge, a tartaruga que voltou para a natureza após 40 anos de confinamento, ensina que ninguém se readapta sozinho, seja na natureza ou em organizações. Uma gestão estratégica é uma gestão que considera as pessoas como um ativo importante.

Ana Clara de Lima

Estagiária de jornalismo, sob supervisão.

Assessoria de Comunicação CFA